José Fernando Souza, de 58 anos, é exemplo de sorte, persistência e superação. Ele conseguiu se tornar juiz depois de ter sido doado numa caixa de sapatos, quando era recém-nascido.
A pequena caixa com um bebê foi oferecida pela mãe biológica em uma praça no centro de João Pessoa, na Paraíba.
A família que ficou com José Fernando deu abrigo, alimento, educação e amor ao menino.
Ele foi o único filho de uma dona de casa e de um policial militar, hoje falecidos.
Foi criado sem regalias, nem fartura, mas com dedicação e carinho. Segundo ele mesmo, isso fez toda a diferença.
Sobre a mãe biológica, ele nunca teve curiosidade de encontrá-la e diz não guardar mágoas.
“Como ter raiva de alguém que não te matou, não te jogou no rio, ficou ali nove meses contigo na barriga, teve as dores do parto, pariu e deu para alguém criar? Ela se viu grávida de um homem casado, não podia voltar para o interior naquelas condições. Era década de 1960. Seria apedrejada em praça pública.”
Juiz
Antes de se tornar juiz da Infância e Juventude de Caruaru, onde mora hoje, José Fernando foi juiz da Vara da Fazenda, na mesma cidade, e analista judiciário no Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba.
Quando foi morar em Pernambuco, tinha 34 anos e já estava casado com Maria de Lurdes Ferreira, com quem teve três filhos, dois advogados e uma médica.
Palestras
O juiz costuma ser chamado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE) para contar sua trajetória nas palestras do Programa Eleitor do Futuro, para estudantes de escolas públicas.
“Na palestra, coloco a história da caixa de sapato como se não fosse a minha história. Relato o caso de uma senhora que vem do interior da Paraíba e vai morar na capital. Ela, muito pobre e sem o marido, que tinha ido para São Paulo, engravidou de um homem casado. No final, conto que eu sou a criança entregue para adoção.”
Estímulo
A ideia de José Fernando é propagar o que ele chama de estímulo a jovens sem muita perspectiva de futuro diante das dificuldades impostas pela pobreza.
“Se eu, que fui pego em uma caixa de sapato na rua, consegui superar os obstáculos da vida e cheguei a juiz, muitos jovens também conseguem se tiverem um objetivo. Tudo o que meus pais me dedicaram foi fundamental. Mesmo pobres, oportunizaram para mim tudo o que estava ao alcance deles. Sempre senti muito amor deles.”
Recado
Hoje, as mães que, por algum motivo, não desejam exercer a maternidade de uma criança podem entregar o bebê nas Varas da Infância dos municípios onde moram sem serem criminalizadas pelo ato.
O abandono em via pública, no entanto, é crime.
Onde atua, José Fernando encontra histórias parecidas com a dele.
Na semana passada, participou de mais uma audiência envolvendo uma mulher que entregou o filho para adoção.
“Se a pessoa nos procura espontaneamente, é recebida. A única coisa que posso esperar é que apareça alguém bem intencionado para levar a criança para casa. Eu sou um grande incentivador da adoção.”
José Fernando ainda tem três anos de magistratura pela frente.
Diz que deseja continuar fazendo algo valioso para o próximo.
A Vara da Infância e Juventude, diz ele, tem sido o canal para atingir seu objetivo.
“É uma porta que Deus me oportunizou. Como juiz da Fazenda, vivia confortável, sem enfrentar qualquer tipo de problema social. De repente, tudo mudou”, lembra.
Com informações do Correio Braziliense