Portugal está mostrando ao mundo a receita para retomar o crescimento, depois de anos mergulhado em uma grave crise econômica que fez o desemprego e o deficit público dispararem.
A surpreendente recuperação e a forma como ela se tornou possível chamam a atenção de economistas no mundo inteiro.
Liderado por uma coalizão de partidos de esquerda, o governo português rejeitou em 2015 a receita de austeridade imposta por credores internacionais e ganhou o endosso de órgãos ortodoxos como o FMI (Fundo Monetário Internacional).
Isso foi quando elegeram uma coalizão de partidos de esquerda, um resultado eleitoral que despertou apreensão nos mercados internacionais e de parte da população.
Críticos previam que a aliança não se sustentaria até o final do mandato, ou que a situação econômica pudesse piorar.
“As políticas que o governo de Antonio Costa (primeiro-ministro do país) implementou iam contra a receita tradicional. Elas reverteram os cortes salariais do governo anterior”, afirmou à BBC, André Freire, especialista do Instituto Universitário de Lisboa.
Salários
“Não é que houve aumento dos salários. Simplesmente foram recuperados os cortes que ocorreram durante o período do resgate.”
O governo restaurou a jornada de trabalho de 35 horas semanais para empregados públicos, que tinha sido elevada para 40 horas em 2013. Além disso, recuperou os valores da aposentadoria e do salário mínimo – reduzidos pela gestão anterior.
Ainda assim, os programas sociais foram implementados de maneira “fiscalmente responsável”, avalia Freire. Eles foram combinados a outros cortes no gasto público, permitindo que Portugal mantivesse os objetivos de redução do deficit impostos pelos credores.
No entanto, outros fatores que impulsionaram a recuperação portuguesa vieram antes da mudança de governo.
No documento divulgado no último mês, o FMI cita o aumento das receitas do turismo, que levaram inclusive ao investimento em infraestrutura, estimulando a construção civil.
O avanço no setor, registrado a partir de 2009, ocorreu em parte por causa da instabilidade política do norte da África, afastando turistas dali.
Em 2016, as receitas turísticas avançaram 10,7%, atingindo € 12,6 bilhões – o maior crescimento absoluto dos últimos dez anos, segundo o governo.
O FMI menciona ainda o aumento das exportações, estimulado pela recuperação do euro.
Segundo dados do INE (Instituto Nacional de Estatística), Portugal vem estabilizando sua balança comercial com o aumento das exportações de bens e serviços desde 2009, em especial para Angola e Espanha.
Índices mais estáveis
O governo Costa celebra o crescimento econômico de 2,8% no primeiro trimestre e o índice de desemprego de 9,5% registrado em abril, o menor desde dezembro de 2008, segundo o INE.
Com esse novo panorama, o ministro alemão da Fazenda Wolfgang Schauble, conhecido por defender fortes medidas austeras na Europa, inesperadamente deu o título de “Cristiano Ronaldo dos ministros da Fazenda europeus” a Mario Centeno, que ocupa o cargo em Portugal.
História da crise
Diante de uma precária situação econômica, Portugal pediu em 2011 um resgate de € 78 bilhões (R$ 285 bilhões) ao trio de credores composto por FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu.
Em contrapartida, foram impostas duras condições fiscais, que o então governo conservador buscou cumprir.
Milhares de trabalhadores acabaram demitidos, salários foram reduzidos e até datas festivas foram canceladas para tentar evitar a falência do país.
Mas o desemprego seguia crescendo, atingindo o pico de 16,2% em 2013 – maior do que o atual índice brasileiro, de 13,7%. E a economia viu uma queda de 3,6% em 2012, a maior da década.
Hoje, a dívida pública ainda segue elevada, chegando em 2016 a € 240 bilhões, o equivalente a 130% do PIB (Produto Interno Bruto) do país.
O especialista diz que é difícil garantir que a fórmula portuguesa serviria a outra nação.
Com informações da BBC