Primeira medalha de ouro nas Olimpíadas de Paris 2024, Beatriz Souza, a Bia, do judô, diz que o esporte foi transformador na vida dela. Ajudou a aceitá-la como é. Com 1,78 metro e cerca de 135 quilos, a atleta desabafou que foi alvo de preconceito por causa da aparência e que sofre por ser “fora do padrão”.
Agora, ela agradece ao corpo que tem: “Não há problema algum em ser gorda, alta ou forte. O importante é ter saúde”, afirmou a jovem, que tem 26 anos. “O judô ajudou a me aceitar como sou. Afinal, meu corpo é meu instrumento de trabalho. Tenho de gostar dele e ele de mim.”
Ela sabe que será inspiração para muitas crianças brasileiras: “Quem diria que eu, que sempre tive dificuldade para comprar roupas e sapatos do meu tamanho, desfilaria na passarela dos campeões, aos pés da Torre Eiffel? Chique, né?”, reagiu ela, que desfilou em carro aberto na sua cidade, Peruíbe, em São Paulo.
Muitas coisas num dia só
Ela contou o que passou na cabeça no momento em que subiu ao pódio.
Lembrou que passou anos em treinos, muitos esforços, derrotas, vitórias até chegar ao ouro. “É uma vida por um dia”, explicou a atleta,
Bia confidenciou que não imagina que “seria assim, tão maravilhoso”. “Brilhei com a Monalisa! Verdade, gente. Fui ao Museu do Louvre, que sempre quis conhecer, e a galera enlouqueceu. Acho que sacaram que eu tinha vencido a Romane Dicko, ídola na França”.
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Desabafo e sinceridade
Ela disse como foi o processo de autoaceitação:
“E, claro, um desfile em Paris me fez lembrar de questões que já tive relacionadas ao meu corpo: “Por que eu não me amo? Qual o motivo?”.
“Sou grande e sei que esse tipo de beleza não é universal. Mas é para mim”, ressaltou Bia. “Maria Suelen, minha treinadora e ex-rival, me ajudou nesse processo de aceitação.”
Foi ali que virou a chave para a atleta brasileira.
“A partir desse momento, eu virei o meu próprio padrão de beleza. Sempre busquei ser saudável, tenho nutricionista, controlo o peso… Sou muito profissional. E isso me ajudou a me amar, a amar muito mais o meu corpo.”
“Sempre fui grandona”
“Sempre fui grandona e, quando pequena, nem sempre era fácil lidar com isso. Na minha adolescência, me sentia um ‘alien’”, desabafou.
A judoca lembrou que tudo é mais difícil para quem não se enquadra no padrão. “Comprar roupa era uma síncope. Tinha insegurança em relação a isso. Até hoje é difícil. Parece que as pessoas querem ser enganadas.”
“Tem loja em que as peças GG são, na verdade, do tamanho M. Eu tenho as costas largas, e essas GG não passam do meu braço. Já devíamos ter pensado nisso, nos preparado para todos os tipos de corpos. O mundo precisa evoluir nesse quesito.”
A procura por sapatos
A atleta reclamou também dos tamanhos de sapato. Com 1,78 metro, ela calça entre 41 e 42 e tem dificuldades para achar calçados.
“Tenho o pé grande, calço 41/42, e é quase impossível comprar sapatos. Tenho de pesquisar as lojas antes pela internet. Não é simplesmente ir ao shopping e escolher”, disse.
E quando acha, esbarra no preço: “Parece um absurdo mulheres calçarem mais de 40. E, quando acho um calçado que serve em mim, é o triplo do valor. Ei, olhem aqui: sou campeã olímpica, e o mundo ainda não está preparado para me receber.”
O dia da vitória
Sobre o dia dia em que conquistou o ouro nas Olimpíadas a atleta revelou:
“O dia da competição foi um dos melhores da minha vida, a forma como lutei, o jeito como coloquei em prática tudo o que havia treinado”, contou. “O coração estava aceleradíssimo. Mas bastou avistar o tatame para me sentir em casa: ‘Cara, eu sei exatamente o que fazer aqui’”.
Ainda muito emocionada, Beatriz Souza disse que jamais vai esquecer o que viveu.
“Essa experiência que vivi em Paris foi incrível, um sonho que achava impossível ou muito distante de ser conquistado. O mais especial foi estrear com medalha de ouro.”
No coração, dedicou a vitória à avó, falecida dois meses antes das Olimpíadas.
“Avó é assim mesmo: enche a gente de carinho. O que eu mais queria era levar minhas medalhas para ela ver, ficar de papo e contar tudo o que vivi aqui. Obrigada por tanto e descanse em paz”, disse a judoca em carta ao O Globo.