Coordenadora da Comissão das Comunidades Quilombolas do Alto e Médio Rio Doce, Marlene Mateus de Sousa, de 52 anos, está entre as novas acionistas da companhia Vale. Ela comprou uma ação da empresa por R$ 79,90 e pode interferir em decisões que afetam os povos originários e o meio ambiente. É a primeira vez que isso ocorrerá!
Marlene tem autoridade para votar na Assembleia Geral Ordinária (AGO) de Acionistas da Vale, como ocorreu na última sexta-feira (28). Ela pretende, assim, tentar impedir eventuais falhas nos estudos socioambientais do projeto Serra da Serpentina, novo empreendimento da mineradora, por exemplo. O projeto mexe na vida de 11 comunidades mineiras.
“É um marco importante. Apesar de ser um ambiente hostil, foi possível levar nossas demandas e a voz de todas as pessoas que foram invisibilidades pela Vale, que sofreram consequências, e vamos sofrer se não conseguirmos parar o novo projeto”, disse a quilombola.
Marco histórico
A presença de Marlene na empresa é um marco histórico.
“Sem dúvida, é bom estar na Assembleia e levar a voz das comunidades negras, indígenas e de toda a nossa ancestralidade, pois nosso povo é como um corpo, e se parte do nosso corpo está doente, todo corpo sofre”, afirmou a quilombola.
Como coordenadora da Comissão das Comunidades Quilombolas do Alto e Médio Rio Doce, Marlene representa mais de 40 comunidades tradicionais, entre quilombolas e indígenas, que devem ser afetadas diretamente pelas obras e operação do megaprojeto da companhia, de extração e transporte de minério de ferro.
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Serra da Serpentina
O projeto Serra da Serpentina em curso, conduzido pela Vale, atingem 11 cidades mineiras. Segundo Marlene, a execução da proposta afetará comunidades, modos de vida e o meio ambiente de Antônio Dias, Carmésia, Conceição do Mato Dentro, Dom Joaquim, Itambé do Mato Dentro, Morro do Pilar, Nova Era, Passabém, Santa Maria de Itabira, Santo Antônio do Rio Abaixo e São Sebastião do Rio Preto.
“Como mulher preta, quilombola e coordenadora da comissão, trabalho para que o rio Doce e seus afluentes não sejam palco de mais um crime. Vimos como foi devastadora a tragédia em Mariana para as comunidades. Para os povos tradicionais, o rio é uma divindade. Não se trata só de uma terra, mas de um território sagrado”, disse a líder
Pelo projeto Serra da Serpentina, haverá instalação de cavas, uma usina, um mineroduto de 115 km, ligando Conceição do Mato Dentro a Nova Era, e pilhas de rejeitos. Para tirá-lo do papel, a Vale irá precisar de licenciamento do Estado de Minas Gerais.
A Vale fez o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) e o entregou à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), no ano passado.
Porém, as comunidades atingidas não foram ouvidas, o que contraria a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), reforçada por uma resolução conjunta da Secretaria do Estado de Desenvolvimento Social e da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Estado de Minas.
Resistência
Marlene integra o Movimento da Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale para alertar os investidores sobre os riscos financeiros que eles correm com as violações de direitos humanos e ambientais cometidos pela empresa.
Além de denunciar o Projeto Serpentina durante a Assembleia, o grupo volta contra a aprovação do relatório administrativo de 2022, em função de outros temas.
Na lista de medidas contrárias estão críticas à transparência em relação à dívida líquida relacionada aos desastres de Brumadinho e Mariana.
É que a Fundação Renova, que faz a administração das indenizações, teve as prestações de contas reprovadas pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o que motivou o órgão a pedir a sua extinção ainda em 2021.
O grupo informa ainda que houve falta de informações também é apontada em relação aos projetos de expansão ferroviária e portuária no Maranhão.
Para o movimento, há dúvidas também sobre o projeto níquel Morowali, na Indonésia. Há denúncias de poluição causada pela mineradora por elevada concentração de metais pesados muito acima do permitido pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Com informações da Midia Ninja, Rede Brasil Atual e Cidades Mineiras Mineradoras