Ao som de cantos e danças, mais de 200 tupinambás se emocionaram ao reencontrar o manto sagrado deles que estava na Dinamarca há mais de 300 anos.
Os indígenas foram do litoral central da Bahia para a cidade do Rio de Janeiro visitar o manto que está sob tutela do Museu Nacional. Com 1,80m de altura e milhares de penas vermelhas de pássaros guará, a peça é considerada por eles como um ancestral. E querem levá-lo de volta.
“Vamos dar esse voto de confiança ao Museu Nacional. Nós vamos para a nossa casa [depois das celebrações] e nosso ancião vai ficar. Mas, pode até demorar muito tempo, esperamos que o governo nos ajude a fazer um local onde ele possa ser preservado [em Olivença]”, disse a cacica Jamopoty Tupinambá.
Cerimônia para reencontro
O artefato chegou ao Rio de Janeiro em julho, repatriado da Europa.
Desde então, os tupinambás tentavam uma cerimônia para poder ver de perto o manto sagrado. E eles conseguiram!
Uma comissão de indígenas saiu de Olivença (BA), em uma grande jornada e último domingo (8), os 300 anos que separaram os tupinambás do manto, finalmente chegaram ao fim.
“Ontem [domingo] nós tivemos a felicidade desse reencontro. Ele sorriu, ele ficou feliz, porque nós estávamos ali, o vendo e ele nos vendo. Ele trouxe consigo a força ancestral de um povo que era considerado extinto. E isso não tem preço. A gente está falando de ancestralidade, de memória, de força”, comemorou Jamopoty em entrevista à Agência Brasil.
Leia mais notícia boa
- Filme brasileiro sobre comunidade indígena é premiado em Cannes; está nos cinemas!
- Estudo aponta 10 mil registros de antigas comunidades indígenas na Amazônia
- Vitória para povos indígenas. Marco Temporal é rejeitado pelo STF
“Bom presságio”
A esperança entre os indígenas com a chegada do manto era grande porque, para eles, a peça sinaliza bons presságios. Há tempos eles desejam que a demarcação de suas terras seja concedida.
“Vivemos num território que tem 47 mil hectares, em três municípios, e abriga 8 mil tupinambás vivendo do extrativismo, da pesca, da agricultura. Esse território está identificado e delimitado pela Funai [Fundação Nacional dos Povos Indígenas]. Ocupamos 80% desse território, porque fizemos nossa retomada e não resta mais nenhum impedimento para que o governo brasileiro assine a portaria declaratória do povo tupinambá”, disse o cacique Sussuarana Morubyxata Tupinambá.
“Voto de confiança”
Hoje, sob a tutela do Museu Nacional, a peça deve ter um outro destino mais para frente.
Os tupinambás pedem que seja construído um museu em Olivença. Lá, o manto ficaria no território dos próprios indígenas.
Há ainda uma expectativa de repatriar outros dez mantos que foram levados para museus europeus.
Luta por repatriação
A peça indígena brasileira chegou em Copenhague, na Dinamarca, em 1689, mas foi produzida pelo menos um século antes.
A repatriação do manto foi anunciada em junho deste ano, e desde então, passou a ser uma das principais peças do acervo do Museu Nacional, no Rio de Janeiro.
Em 2000, o manto foi exposto no Brasil, mas depois voltou para a Europa. Na época, a anciã tupinambá Amotara – agora falecida – viu o artefato e disse ter “sido reconhecida por ele”.
A partir daí, os indígenas travaram uma luta para repatriar a vestimenta.
Agora, com o manto sagrado em solo brasileiro, os tupinambás seguem em tratativa com o Museu para que a peça possa ser vista pelo público com garantias de que não será danificada.
“A gente está fazendo tratativas com o Museu Nacional para fazer a visita guiada, por conta da questão da conservação [do manto]. A gente vai ver qual o número que poderá participar de cada visita. A gente quer que todos que vieram [ao Rio de Janeiro] possam ter acesso ao manto. A gente pretende, com base na orientação da equipe técnica do museu, entender melhor como vai ser essa visitação, para que não haja transtornos”, explicou Karkaju Pataxó.